Colóquio: Richard Dawkins: o revolucionáro racional

Jo  Pires-O’Brien

‘Richard Dawkins:The Rational Revolutionary’, ou, em português, ‘Richard Dawkins: o revolucionáro racional’, é o título do colóquio que eu tive a oportunidade de assistir em 14 de julho de 2016, em Londres, promovido pela Intelligence Squared (intelligence2; Inteligência ao Quadrado), um fórum mundial de debates inteligentes fundado em 2002 em Londres, com o objetivo de celebrar os 75 anos do cientista bem como os 40 anos da publicação de O gene egoísta (The Selfish Gene, 1976) e os 10 anos de Deus, um delírio (The God Delusion, 2006). O colóquio teve lugar no auditório do Immanuel Centre, em Londres, não muito distante do Parlamento. Em adição ao próprio Dawkins, havia outros seis palestrantes: o jornalista e autor Jonathan Freedland (1967 -), que atuou como Presidente, a psicóloga, professora universitária e escritora Susan Blackmore (1951 -), o ilusionista e autor Derren Brown (1971 -), o dramaturgo e escritor Michael Frayn (1933 -), e através de ligação por vídeo, o filósofo e cientista cognitivo Daniel Dennett (1942 -) e o psicólogo e cientista cognitivo Steven Pinker (1954 -).

É interessante notar que dentre os palestrantes havia três não-cientistas, todos três confiantes na própria capacidade de discutir ciência com Dawkins, Dennett, Pinker e Blackmore. Dentre os não-cientistas, o que mais atraiu a curiosidade foi o ilusionista Deren Brown, que notabilizou-se pela prática da sugestão psicológica, com a qual ele é capaz de desbancar as pretensões de espiritualistas e milagreiros. Michael Frayn é o autor da peça de teatro ‘Coppenhagen’ que foi atuada com sucesso em Londres e Nova Iorque, e que trata da física quântica e do desenvolvimento da bomba atômica. Jonathan Freedland, o Presidente, é um jornalista e radialista premiado, crítico literário, e autor de diversos livros de não-ficção e de ficção.

O presente ensaio é a minha versão desse evento, compilado a partir das anotações que fiz durante o mesmo. Reconheço que não é uma transcrição completa mas sim um esboço daquilo que consegui capturar. Peço desculpas adiantadas por falhas eventuais que possa ter cometido.

Abertura do Colóquio

O colóquio ‘Richard Dawkins: The Rational Revolutionary’ ocorrido em 14 de julho de 2016, no auditório principal do Emmanuel Centre, na Marsham Street, Westminster, contou com a participação de cerca de 600 pessoas. Os palestrantes sentavam-se em cadeiras voltadas ao público: Frayn, Dawkins, Freedland, Blackmore e Brown. Acima desses ficava um telão, onde as imagens de vídeo dos outros dois participantes Dennett e Pinker seriam projetadas.

Dois painéis com citações bíblicas, localizados em ambos os lados do telão acima mencionado, mostravam que o local se tratava de uma igreja cristã. O do lado esquerdo tinha a inscrição ‘I am that they might have light and that they might have it more abundantly. John 10:10’, enquanto que a do lado direito dizia ‘Immanuel: God with us. Matt. 1:23’. Os presentes no colóquio certamente notaram a ironia de evento de ateístas ser realizado numa igreja cristã.

De início, Hanna, a representante da Intelligence Squared, apresentou cada um dos participantes, e, em seguida, ela deu a palavra ao jornalista, radialista e ator Stephen Fry, o qual falou através de vídeo, louvando o homenageado Dawkins. Dando início ao colóquio propriamente dito, o seu Presidente, Jonathan Freedland, começou afirmando que o evento daquela noite seria mais uma conversação do que um debate, mas uma conversação especial pois envolveria alguns dos mais influentes pensadores da atualidade.

O gene egoísta

Freeland começou pedindo a Dawkins que explicasse o porquê dele ter se arrependido de ter usado a expressão ‘gene egoísta’. Dawkins respondeu que era porque muita gente julga os livros pelos seus títulos, e, no caso do livro O gene egoísta, muita gente interpretou a palavra ‘egoísta’ ao pé da letra e não metaforicamente como ele havia intencionado. Segundo Dawkins, o seu livro O gene egoísta chegou a ser associado com a ascensão de Margareth Thatcher ao cargo de Primeira Ministra, cuja política de privatizações e defesa do livre mercado fez com que fosse vista por muitos como uma pessoa egoísta. Dawkins disse ter cogitado o título ‘The Immortal Gene’ (O gene imortal), mas que o seu editor tinha preferido ‘O gene egoísta’. Os outros participantes concordaram que o título ‘O gene egoísta’ era por si provocante, mas afirmaram que isso era uma boa razão para mantê-lo.

Genes como replicadores e os memes

Blackmore falou que o sentido da palavra ‘egoísmo’ no livro O gene egoísta tinha a ver com a tremenda capacidade de autorreplicação do gene, a qual envolve copiar informação e passá-la a um novo organismo através da reprodução sexuada; falou dos erros que podem ocorrer durante a cópia das informações genéticas, e, que tais erros levam às variações que costumam aparecer.

Blackmore abordou o tópico dos ‘memes’ palavra criada por Richard Dawkins a partir da palavra grega ‘mimeme’, que quer dizer ‘imitar’, e introduzida no seu livro O gene egoísta. Os ‘memes’ de Dawkins são outras coisas auto-replicáveis, podendo ser ideias ou qualquer coisa cultural; os ‘memes’ podem advir da ciência, da arte e da música, e até de coisas como a moda. Assim como os genes, os memes também sofrem alterações durante esse processo de propagação. Conforme Blackmore, a religião é uma fonte poderosa de memes. “Se você acredita que seja uma boa pessoa, você não consegue acreditar que seja uma má pessoa, e assim sendo, continua a agir de uma mesma forma”.

A ideia perigosa de Darwin

Dennett falou acerca do processo de adaptação dos organismos através da seleção natural descoberta por Charles Darwin, e, porque tal processo foi e ainda é considerado uma ideia perigosa. Conforme ele próprio descreveu no seu livro Darwin’s Dangerous Idea (A Ideia Perigosa de Darwin; 1995), a explicação natural para o surgimento das espécies, através do processo de adaptação ao ambiente, contraria as explicações sobrenaturais contidas nos livros de revelação religiosa.

Por que a seleção natural demorou tanto para ser descoberta

Dawkins afirmou que o fato da seleção natural só ter sido descoberta no século XIX é algo que sempre o intrigou. Por que não Aristóteles ou outro que veio depois dele? Uma possível explicação dele para tal atraso é que a enorme beleza do mundo possivelmente predispôs o homem a aceitar a explicação supernatural da existência do universo.

Fayn apontou que tanto Darwin quanto Wallace (Alfred Russell W.) eram naturalistas de campo, e que esse pode ter sido o fator crítico da descoberta da seleção natural. Blackmore completou que a descoberta da seleção natural tirou o homem do pedestal que antes ocupava. Segundo Pinker, a descoberta da seleção natural decorreu tanto da intuição de Darwin quanto do fato dele ter ligado a riqueza da vida na Terra à reprodução dos organismos. Retomando a palavra, Dawkins levantou a possibilidade de que a ‘forma ideal’ do essencialismo platonista – a ideia de que cada entidade específica possui um conjunto de atributos tal,  necessário para a sua identidade e função – possivelmente teria dificultado imaginar formas em mutação.

A fé e o poder psíquico

Derren Brown, um conhecido ilusionista inglês que iniciou uma carreira na televisão em dezembro de 2000 com a série Mind Control (Controle da mente), é também um desmascarador da arte da manipulação psicológica. Para Brown, o poder psíquico costuma ser empregado por pregadores religiosos para demonstrar o poder do divino, quando na verdade é um fenômeno inteiramente natural. Brown falou que embora ele sempre tivesse deixado isso claro para as suas audiências, que ocasionalmente as pessoas pedem a ele que se comuniquem com indivíduos já falecidos, o que mostra que muita gente não consegue abrir mão do supernatural.

Novos ateístas

Foi colocado a Dennett que ele faz parte do grupo conhecido como ‘novos ateístas’ (autores do início do século XXI que escreveram livros promovendo o ateísmo, os quais incluem Dennett, Dawkins, Christopher Hitchens e Sam Harris). Dennett é autor de Breaking the Spell: Religion as a Natural Phenomenon (Quebrando o encanto. A religião como fenômeno natural; 2007) e Caught in the Pulpit: Leaving Belief Behind (Apanhado no púlpito: deixando para trás a crença; 2013), com Linda LaScola. Dennett falou que o termo ‘novos ateístas’ simplesmente se refere a ateístas declarados, pois são muitas as pessoas que não revelam que são ateístas. Ele acha que o número de ateístas declarados nos Estados Unidos cresceu desde a publicação do seu livro (Breaking the Spell). Segundo ele, era comum na classe dos professores universitários não desejar impor seus ateísmos, mas que agora muitos já decidiram não mais continuar no papel de ‘acadêmicos ateístas gentis’.

A visão antiga do ateísmo

Frayn lembrou como era a visão antiga do ateísmo na época que ele havia se alistado no exército britânico. Ele conta que, quando escreveu que era um ateísta no formulário de dados pessoais, o seu supervisor imediato não entendeu o que ele havia escrito e presumiu que ele era ‘essayist’ (ensaísta). Frayn confessou que embora ele tivesse se declarado ateísta desde jovem, que hoje em dia ele já não gosta de ser rotulado um ateísta, pois ser ateísta significa simplesmente alguém que não crê em Deus, enquanto que existe muitas outras coisas que ele também não acredita, o que faz dele ‘a-cinderelista’, ‘a-papainoelista’ e mais um monte de ‘a-coisistas’.

O grande tecido da religião

Frayn disse ter dificuldade de entender não apenas por que as pessoas creem mas também por que muitas pessoas não conseguem mudar de ideia seja qual for o motivo. A explicação dele é que as pessoas desejam fazer parte do ‘grande tecido da religião’ e, consequentemente, não refletem acerca dos motivos para seguir determinada religião. Uma evidência disso é o fato dos congressistas americanos serem em sua maioria religiosos.

O consolo da religião

Frayn levantou a questão de que a religião dá consolo, e portanto, se seria uma boa coisa tirar do povo esse consolo. Blackmore respondeu que no seu caso, ela preferiria sempre a verdade sobre qualquer outra coisa. Frayn assumiu o papel de advogado do diabo e perguntou: ‘Que mal pode fazer se as pessoas vão à igreja e se sentem bem com isso?’ Dawkins respondeu afirmando que a fé religiosa leva ao sentimento anti-ciência e contra os cientistas. Entretanto, alguém mostrou que há muitos cientistas que declaram ter fé religiosa. Como explicar isso? O fato de alguém declarar ter fé religiosa não significa que esteja falando a verdade. Muita gente pensa que não existe outra fonte de moralidade senão a religião, e isso é um motivo para afirmar ter crença religiosa mesmo sem ter. As pessoas têm as mais diversas razões para frequentar igrejas: lealdade, comunidade tribal, gostar dos hinos, gostar do vigário etc. Entretanto, há muitas outras fontes de consolo sem ser a religião como a amizade e o amor.

Vigários que não creem

Dennett falou que existe muitos vigários (pastores protestantes) que não são crentes mas mesmo assim continuam desempenhando o papel de crente. Tal afirmação é o resultado de entrevistas confidenciais realizadas com clérigos de diversas denominações, o qual foi publicado no livro que ele escreveu junto com Linda LaScuola: Caught in the Pulpit: Leaving Belief Behind; 2013.

O Islã como fonte atual do mal

O próximo tema discutido foi a religião islâmica. Dawkins afirmou que embora outras religiões tivessem cometido atrocidades no passado, no presente é o islamismo que as tem cometido. O próprio islamismo é a fonte de poder para tais atrocidades. A sua escritura sagrada, o Corão, ordena cortar cabeças, chicoteamentos, apedrejamentos, jogar homossexuais em abismos, etc. Não há como negar que o islamismo seja uma fonte atual do mal.

Relação entre as ciências e as artes

Freedland perguntou se o hiato identificado entre as ciências e as artes ainda existe ou se tem diminuído. A seu ver, ainda há muitas pessoas oriundas das artes que não conseguem entender as ciências, e muitos cientistas que não entendem as artes. Dawkins lembrou que Frayn, um oriundo das artes, escreveu a peça teatral Copenhague, para a qual ele precisou compreender bem a física quântica, uma das mais difíceis áreas da ciência. Abrindo um parêntese, a peça de Frayn é centrada em dois encontros fictícios entre os físicos quânticos teóricos, Werner Heisenberg (1901-76) e Niels Bohr (1885-1962), um em setembro de 1941, quando ambos trabalhavam aconselhando o governo dos Estados Unidos acerca da bomba atômica, e outro em 1947, após o fim da Primeira Guerra e no início da Guerra Fria. Frayn explicou que precisou ler muitos livros escritos por cientistas a fim de entender o suficiente de física quântica para escrever Copenhague.

Os novos sumos-sacerdotes do conhecimento

Dawkins usou a analogia do ‘sumo-sacerdote’, os clérigos mais importantes das religiões antigas, para se referir ao papel dos cientistas no conhecimento humano. “Como os indivíduos que atuam nas artes normalmente não entendem de ciência, os cientistas eram os ‘sumo-sacerdotes do conhecimento’”, afirmou. Em seguida, Dawkins abriu um espaço para afirmar que o entendimento de ciência de Michael Frayn, um homem oriundo das artes, era uma exceção. Conforme visto anteriormente, Frayn é o autor da peça Copenhagen, que requereu conhecimentos de física quântica, uma área da ciência de notória dificuldade.  Dawkins  então fez um desabafo ligado ao ataque que sofreu de certos colegas cientistas, quando afirmou que “os novos sumo-sacerdotes do conhecimento são os cientistas que vilificam outros cientistas simplesmente porque explicam a ciência ao público leigo”.

A fé na ciência

A fé não é exclusiva da religião mas também ocorre na ciência, cuja amplitude impede que os cientistas entendam tudo acerca das disciplinas que não são as deles. Blackmore, que atua no campo da psicologia, admitiu que muitas vezes aceita afirmações da física quântica e de outros tópicos complexos da ciência, pela fé e não pelo entendimento. Entretanto, ela completou o argumento afirmando que a fé na ciência não é a mesma coisa do que a fé na religião, pois a ciência possui métodos de procedimentos que incluem a repetição do experimento.

A batalha do significado

Brown apontou o fato de que a religião dá significado às pessoas, como sendo a derradeira dificuldade para eliminar a religião. Em meio às suas ambiguidades impossíveis acerca da morte, a religião oferece um significado macio ao qual as pessoas se agarram, e, sem o qual, se atirariam das pontes. Mesmo baseando-se em coisas impossíveis, a religião dá às pessoas o significado que precisam. Portanto, há uma batalha pelo significado entre a ciência e a religião.

Perguntas do público

Ao fim da conversação entre os sábios presentes, teve início a parte em que membros da audiência fizeram perguntas, algumas das principais sendo listadas a seguir.

  • Há lugar para a serendipidade nesse mundo do ateísmo?
  • Como explicar casos em que uma pessoa sonha com outra e essa outra pessoa morre logo em seguida?
  • O mundo seria um lugar melhor se não existisse a religião?
  • Por que não tratar as declarações de fé como sendo um assunto pessoal?
  • Por que a religião ainda existe?
  • Onde e como as pessoas podem encontrar significado fora da religião?
  • Por que o Oriente Médio não teve uma revolução ateísta assim como o Ocidente?
  • Pode a ciência desprovar Deus?
  • O que acham os palestrantes acerca do determinismo e do livre arbítrio?

Respostas dadas

Os participantes responderam às respostas do público, embora sem seguir a ordem exata em que foram formuladas. Brown falou que as pessoas querem que haja uma narrativa em torno de si próprias, e, por essa razão, se agarram à crenças e à religião. As pessoas anseiam por serendipidade, isto é, que coisas boas aconteçam uma depois da outra. Entretanto, o acontecimento de coisas felizes ou úteis está ligado à lei das probabilidades. O fato de uma pessoa ter morrido logo depois de alguém ter sonhado tal evento, não significa que a morte da mesma ocorreu devido ao sonho. Há coisas cuja chance de acontecer é de um para muitos milhões, mas mesmo assim acontecem.

Dennett explicou que a religião continua existindo porque é um replicador de si própria. O valor para um replicador significa um valor que seja útil ao próprio replicador. Portanto, a religião não precisa ser boa para que sobreviva, pois foi programada para sobreviver.

Pinker acha que o mundo seria melhor sem a religião. A seu ver, o problema em julgar a crença religiosa como sendo meramente uma questão pessoal não se limita ao fato da religião tratar de inverdades; há também o fato de que é muito difícil manter o espaço privado separado do espaço público. A verdade é bela, elegante e gloriosa, e, por essas razões, deve ter primazia sobre qualquer inverdade.

Dawkins aponta outro problema da crença religiosa que é o abuso de crianças. Ele reconhece duas formas desse tipo de abuso, quando um adulto fala do inferno com uma criança, e a rotulação de crianças com a religião de seus pais.

Dawkins gostaria que as pessoas parassem para pensar nos pontos incompatíveis ensinados pela religião. A teoria evolutiva de Darwin já mostrou que Adão e Eva não existiram, e se não existiram, também o pecado original nunca existiu.

Perguntado sobre o que pensa das outras crenças das crianças como a crença no Papai Noel, Dawkins afirmou que sua filha acreditava no Papai Noel, mas que logo deixou de acreditar, assim como as outras crianças. Entretanto, ele lembrou que a crença em Papai Noel é diferente das crenças religiosas por ser algo temporário. As crianças eventualmente param de acreditar no Papai Noel, mas continuam acreditando em Deus.

Para Dawkins, o mundo ligado à religião é um mundo empobrecido. É também repleto de obscenidades como a narrativa em torno do pecado original. Como é que o Deus que é o inventor de tudo, precisou empregar tortura e morte para redimir o suposto pecado da humanidade? Por que não encontrou uma maneira melhor para redimir tal pecado? A religião não é a única fonte de significado para a vida das pessoas. Basta olhar à volta no mundo para encontrar significados. A arte e a música são excelentes fontes de significado.

Dennett falou sobre como as pessoas podem encontrar significado fora da religião. Primeiro você procurar algo admirável que seja muito maior do que você mesmo, e depois, você se dedica ao mesmo.

Brown admitiu que embora a ciência não tenha como desprovar Deus, isso não significa que Deus exista. Ele explicar isso fazendo um paralelo entre Deus e outra coisa qualquer que alguém diz acreditar. “Um homem pode afirmar que em sua casa tem um rato verde, mas o fato de ser impossível provar que tal rato verde não existe não significa que o mesmo exista”. Portanto, o ônus da prova é do afirmador e não do negador.

Acerca da questão do determinismo e do livre arbítrio, três participantes deram três respostas diferentes. Blackmore negou acreditar no livre arbítrio e afirmou que o passado das pessoas e as suas situações ambientais determinam como as pessoas se comportam em determinado momento. Dennett critica o raciocínio determinista, afirmando que o mesmo pode levar um criminoso a não assumir a responsabilidade pelo seu crime, afirmando simplesmente ‘o meu cérebro me obrigou a fazer isso’. Dawkins optou em responder a pergunta citando a seguinte frase de Christopher Hitchens: “Eu não creio no livre arbítrio mas não tenho escolha”. As posições diferentes de Blackmore, Dennett e Dawkins, mais o paradoxo contido na resposta de Dawkins, mostram que o determinismo e o livre arbítrio são assuntos demasiadamente complexos para o momento e o local.

Dawkins encerrou o evento reafirmando a importância de repassar os bons memes. “Embora a nossa existência hoje deva-se a uma longa linha de ancestrais que tiveram sucesso em passar os seus genes para as gerações sucessivas, não é preciso ter filhos para passar os bons memes adiante”, concluiu o cientista.

Conclusão final

O colóquio acima descrito foi uma homenagem ao cientista e escritor Richard Dawkins, e, por essa razão, girou em torno dos temas mais chegados a Dawkins: ‘memes’ e ateísmo. É interessante notar que em nenhum ponto do colóquio o conceito dos ‘memes’ foi explicado. Tal fato sugere uma presunção de que a audiência presente entendia do que se tratava, e, portanto, uma explicação não era necessária. Para os que não familiarizados, Dawkins criou o conceito de ‘memes’ para designar “unidades hipotéticas de cultura e de comportamento que passam de um indivíduo a outro através da imitação”. Os ‘memes’ são análogos aos genes no sentido em que ambos são replicáveis. A diferença entre os dois está no modo de replicação: enquanto que os genes são replicados geneticamente, os memes são replicados pela imitação. Todos os três cientistas que participaram do colóquio, Daniel Dennett, Steven Pinker, e Suzan Blackmore, já haviam empregado o conceito de ‘memes’ em suas pesquisas. Todos os participantes do colóquio concordaram que o homem encontra consolo nas coisas que têm significado, e, que o significado obtido da verdade é melhor do que o obtido da inverdade. Concordaram ainda que existem boas coisas no mundo que merecem ser replicadas para o bem de toda a sociedade.


Jo Pires-O’Brien é editora da revista eletrônica PortVitoria sobra a cultura ibérica no mundo, de generalidades, cultura e política. Em 2016 ela publicou O homem razoável e outros ensaios (2016), uma coleção de 23 ensaios sobre os mais diversos temas da civilização ocidental, disponível em todos os portais da Amazon. US$ 9.99.

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